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segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Brígido Nogueira para Lucas Afonso

Escrito por Thomaz Nogueira

Lucas, meu filho, hoje no teu aniversário quero te falar do meu pai.

O calendário já marca 26 anos, 4 meses e 16 dias desde que ele se foi. Mas não é assim que a saudade marca a gente. É através de milhares de lembranças. 
Os que não o conheciam de perto viam nele um sujeito sempre sério e mesmo sisudo. Além da seriedade e sisudez, havia um coração imenso. Duvido que alguém tenha recebido mais beijos e afagos que os filhos do Brígido. 
Hoje a mamãe lembra que quando eles decidiram ter “os filhos que Deus lhes desse”, também decidiram que trabalhariam o que fosse necessário, para que não faltasse pão e educação. Talvez, não imaginassem que seríamos quinze, mais nossas três primas-irmãs. Não faltou pão, não faltou educação e não faltou afeto. 
Quando me tornei pai da Mariana, da Rebeca e de ti, me perguntava como eles faziam? Quantas horas tinham os dias? Nunca faltaram as reuniões, que eram noturnas, na escola. Davam palestras. Participavam de uns tantos movimentos dentro e fora da igreja (Cursilhos de Cristandade, TLC, Escola de Pais, Equipes de Nossa Senhora, Diálogo, Cursos de Noivos, Ministério da Eucaristia, etc.).
Ele trabalhava fora em dois empregos; à noite e nos fins de semana era alfaiate. Na realidade, ele acordava às 5 horas e costurava até a hora de ir para o trabalho às 7:30. Por isso, apesar das milhares lembranças, algumas marcantes - como quando ele nos levava pra nadar no fim da tarde ou no domingo pela manhã no Rio Negro, ali no fim da rua Wilkens de Matos [conhecido também plano inclinado], ou quando nos colocava na rede com ele e cantava por horas – lembrei, hoje, de como era dormir ouvindo uma música diferente: mecânica, repetitiva, que agora é uma melodia na lembrança.
Era a música da Necchi BU [sua máquina de costurar] funcionando noite adentro. Crescemos ouvindo a Necchi BU sendo tocada pela mão habilidosa do velho Brígido, transformando gabardine, cambraia, tropical e tudo quanto era tecido, em ternos bem cortados e feitos sob medida. Ver cortar e alinhavar o pano e dali sair um terno, ah! Impressionava um menino.. 
Não apenas as roupas dos clientes, mas nossas roupas. Ele fazia nossas fardas da escola, as roupas sociais, tudo. Não dá pra descrever quando ele nos chamava e começava a tomar as medidas. A gente ficava ali parado, e ele ia medindo, media, colocava a trena em volta do pescoço, anotava as medidas, voltava a medir, até concluir. Meu terno de casamento foi o ultimo trabalho dele pra mim. Uma vez ouvir ele dizer: “Quando eu era mais jovem fazia um terno em 48 horas.”
Aquele universo de giz, fita métrica, réguas diversas e agulhas fez coisas fascinantes, fez uma família. Desenhou o mapa do caminho, nos mostrou a métrica a seguir. 
A régua curva é uma história a parte. Além de fundamental nas nuances da alfaiataria, também foi fundamental para corrigir nossas derrapagens. “Vá buscar a régua curva” tinha um significado especial, a correção vinha a caminho. Nunca a régua curva zumbiu na minha mão sem que eu não merecesse. 
A velha Necchi BU forneceu sustento e educação. Papai não é uma lembrança, é uma presença.