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domingo, 10 de julho de 2016

Phryné Maryan

Depois de um ano e meio de sofrimento devido a uma doença pulmonar que lhe consumiu muito e testou sua fé, partiu prematuramente, nesta tarde, uma prima muito querida. Filha da irmã mais velha da minha mãe, tia Cleonice; Phryné era baiana nascida em São Paulo, criada uma boa parte de sua vida em Brasília.

Morava na Bahia. E se não havia partido antes, não foi por causa dos remédios ou oxigênio adicional que recebeu nos últimos 18 meses, em São Paulo, onde estava morando com sua irmã Wladilene. Foi justamente o amor excessivo que recebeu da irmã, e dos outros membros da família que ficaram em Salvador, mas que lhe visitavam constantemente: marido, filhos e irmã, que lhe oxigenaram a vida, e impediam que ela partisse. Retribuindo-lhe o amor que sempre receberam dela.

Phryné era a matriarca dos Maryans em Salvador. Administrava-os com muito amor, carinho e suporte de todos os tipos, inclusive financeiro.

Inteligência privilegiada, era formada em Ciências Contábeis e em Direito. Professora a Universidade Federal da Bahia.Foi por muitos, até se aposentar, funcionária da SEFAZ baiana. Após sua aposentadoria continuou trabalhando, pois seria muito desperdício que uma pessoa tão brilhante parasse para ficar observando a paisagem.

Filha, mãe, irmã, prima, tia, avó, sobrinha, cunhada muito querida. Agora tem uma nova missão: vai continuar olhando pelos seus. Só que agora é full time, tempo integral, orando, rezando por eles.

Deus foi-lhe caridoso, se pararmos para pensar que no período de sofrimento ela se apegou, e se aproximou mais Dele. 

E hoje partiu justamente quando eu estava na missa rezando por ela. E vários amigos e parentes, em Manaus, Salvador, Brasília e São Paulo rezavam, oravam por ela. Desde já invejo por uma partida igual.

Deve ter sido uma recepção e tanto. Estou muito triste e muito feliz. Triste porque ela vai fazer falta para muita gente que lhe amavam muito; e feliz porque Deus lhe deu a oportunidade de refletir sobre sua vida nesse ano e meio. Teve bastante tempo de se arrepender de seus pecados. Arrependeu-se, como me disse há três dias pelo whatsapp.

Muito obrigado Senhor Deus Pai Todo Poderoso pelos 63 anos da Phryné, ou di Phryné, como dizem os baianos.

Vá para perto de Deus nossa querida prima. E não esqueça de interceder por nós que te amamos muito.

Deus seja louvado.


Cláudio Nogueira

sexta-feira, 8 de julho de 2016

For the Record : Preso na Carolina do Norte

Para Maria Fernanda, João Paulo, Pedro Henrique e Maria Rafaela.


Há 25 anos fui preso na cidade de Fayetteville, na Carolina do Norte. Já não me lembrava mais dessa história, mas domingo (03/07), em uma conversa de irmãos com um amigo,sobre a Carolina do Sul e a do Norte, o Vicente comentou: "Ele foi preso na Carolina do Norte."
É verdade, eu nem me lembrava mais disso: fui preso e algemado. Mas já paguei minha dívida com a sociedade.

Toefl Test
Dia 6 de agosto de 1991 embarquei para Miami, para fazer a prova do TOEFL, Test of English as a Foreign Language. Para quem deseja estudar em uma universidade americana tem que fazer o Toefl, que atesta o nível de proficiência do candidato. Ele é válido somente por dois anos. Eu já havia feito anteriormente, mas já tinha perdido a validade.

Campeões do Mundo
Antes de prosseguir, não posso deixar de registrar uma coisa muito interessante que ocorreu no front desk do hotel. Disso eu jamais me esquecerei. O senhor que me atendeu, quando soube que eu era brasileiro, disse-me os nomes de todos os jogadores da seleção brasileira de 1958; quando fomos campeões pela primeira vez. Isso é incrível ou não é? O cara era argentino.

Eu tinha planejado que depois que terminasse o teste eu iria dirigindo para Rockville, em Maryland, que é a Goiás do States, pois dentro dela fica a capital Washington. Rockville fica a meia hora de Washington; e tem trens ligando as duas.

Iria visitar uma namorada, que era daqui de Manaus, mas que foi morar com a irmã. Na realidade não era um namoro firme, como se dizia na época, era uma ficante, como se diz hoje. Estávamos em fase de negociação. Fui lá pra ver se a gente fechava o contrato.

Sem Cartão
O negócio começou errado logo na chegada. Fui alugar um carro e descobri que não tinha levado o cartão de crédito. Ninguém aluga carro com pagamento em cash.  No cartão está toda a vida da pessoa. É muito mais seguro para quem aluga. Depois de rodar por várias locadoras e não conseguir alugar um carro, uma pessoa me indicou a Rainbow rent a car; que aceitou o pagamento em espécie.

Fiz o teste, que acabou por volta de uma da tarde; comi alguma coisa e peguei a estrada: I90 N, interstate 90 north. Seria algo em torno de 15 horas de estrada. Por volta das 23 horas o sono chegou, e chegou com muita vontade.

Essa viagem foi uma leseira baré, pois não verifiquei se de avião era mais barato; e porque havia decidido ir dirigindo sem parar. Mas parei em uma rest area, lugar onde motoristas profissionais e carros de passeio param para beber alguma coisa, ir ao banheiro e descansar.
Não aguentei. Parei e dormi um pouco. Quando acordei fui ao banheiro, tomei água e um pouco de café. Ao voltar para o carro constatei que ele estava fechado com a chave dentro. Tentei abri-lo, mas não consegui. Pedi ajuda dos presentes,mas não conseguimos. Era um Mitsubishi, do tamanho de um Gol. Nas laterais, além dos vidros das portas do motorista e do passageiro, havia um terceiro vidro, em forma de um triângulo. Igual ao que o fusca tem na frente. Só que era atrás e não abria, era fixo.

Havia um caminhão de mudança estacionado. Fui falar com o motorista, que me deu uma lata de tinta. Dei uma cacetada com a lata no vidro pequeno, que o assento detrás ficou cheio de vidro. Consegui entrar no carro e seguir viagem. Depois de andar alguns quilômetros, percebi que a gasolina estava entrando na reserva, e naquele trecho a estrada estava muito escura. Até que vi uma placa informando a próxima saída: Fayetteville Regional Airport. Eu pensei: é pra lá que eu vou. Aeroporto é sempre um lugar movimentado. Era uma hora da manhã do dia 8.

Teje Preso
O aeroporto era pequeno. Lembrou-me do nosso Ponta Pelada. O estacionamento estava cheio de carros; mas o aeroporto estava fechado. Não tinha uma viva alma. Estacionei, e comecei a gritar: anybody there? Tem alguém aí ? Imaginei que deveria ter um vigia. Como ninguém respondeu, me conformei, e pensei: vou ficar aqui até amanhecer. E decidi dar uma volta no estacionamento. Nisso, como nos filmes, apareceram do nada dois carros de polícia com as sirenes tocando. Do primeiro desceu uma loira, que apontando uma arma para mim dizia: "Mãos na cabeça". Não senti medo. Não tinha feito nada de errado.
Fayetteville Regional Airport
A loira e um policial latino mandaram me virar de costas, e começaram a me revistar. Eu repetia: não tem nada de errado. A loira repetia: "Cala a boca ! Cala a boca !". Alguém tinha ido ao carro e voltou dizendo: " O carro é roubado, ele quebrou o vidro".
Acharam o meu passaporte no meu bolso. A loira falou pelo rádio o meu nome e disse para verificarem se entrei legalmente no país. Trouxeram um cão para cheirar o carro, em busca de drogas, eu acho. O cão parecia se negar a fazer o serviço. Não parecia muito interessado. Colocavam-no dentro do meu carro, mas ele saia imediatamente. Abriram a mala do carro, e colocaram o cão para cheirar. A mesma coisa; não se mostrou muito interessado. Aí abriram a minha mala. Ouvi quando um policial gritou que tinha liguor, bebida alcoólica. Eu levava cinco garrafas de Velho Barreiro, era encomenda do dono da casa. Médico americano, especialista em malária, que andou por essas bandas, onde conheceu a sua esposa, e gostava muito de caipirinha.
Quando acharam a cachaça, eu pensei: agora estou roubado. Mas isso - e o cachorro revistando o carro - eu assistia algemado, sentado na gaiola do carro da polícia. Porque o melhor já tinha ocorrido antes. Ao me revistarem, eles acharam o passaporte e 14 mil dólares nas minhas meias. O que levou o policial latino a exclamar: "Ó my God !". E a pensar: " Esse tá ferrado."Mas não fiquei com medo. Eu pensei: esse dinheiro não é meu. Se ele tirarem uma quantia como imposto não estou nem aí. Hoje quando me lembro que os autodenominados apóstolo e a bispa Estevam e Sônia Hernandes pegaram um ano de cadeia por terem sidos descobertos com dólares não declarados à alfândega americana, eu sinto um calafrio na espinha. A barba grande ajudava a completar o quadro de que eu não era flor que se cheirasse.
E assim as horas iam passando. Um grande movimento de policiais pra lá e pra cá; mais carros haviam chegado. O dia estava amanhecendo. Até que por volta de uma seis da manhã, um sujeito entra no carro, tira as minhas algemas, e me diz: " Você entrou legalmente no país, e achamos o recibo do aluguel do carro".

Na Delegacia
O carro ficou no aeroporto, e me levaram para a delegacia de polícia. Chegando lá, outros policiais, colocaram  o dinheiro numa mesa, na minha frente e pediram que eu contasse. E muitos simpáticos perguntaram-me como havia conseguido aquilo. Conversaram bastante. Perguntaram-me, também, o que eu fazia na vida. Disse-lhes que era engenheiro e professor, num que um disse para o outro: "He is smart. He is smart." Depois acrescentou: "Você é maluco. Você não sabe o risco que você passou. Por uma nota nesse valor (mostrou-me uma nota de 20 dólares) você poderia ser morto". Eu não entendi. Eles me explicaram que poderia ter sido assaltado.
Nisso apareceu a policial loira, o latino e um que parecia ser o chefe,que me tirou as algemas. E me disseram que eu iria falar com um juíz. Dito e feito. Na presença do juiz, a loira com voz suave, narrou o que aconteceu. E disse que tinha sido um engano por parte deles, e que não foi encontrado nada de errado. O juiz ouviu tudo, e me perguntou:
- Você quer registrar alguma queixa ?
- Não. Eu gostaria de ir embora.
- You are free to go. Sentenciou o magistrado.
A loira me levou até o estacionamento do aeroporto, onde o meu carro estava, e depois me levou até um posto de gasolina. Mas tudo isso para me fazer um pedido. Ela queria saber se não dava para lhe dar uma garrafa do liguor. Disse-lhe que infelizmente não era possível,  porque era uma encomenda e não me pertenciam. Peguei a estrada e me mandei para  Rockville.

Mundo Pequeno
No período que estive retido e algemado, como não me lembrei que poderia ser preso por não ter declarado o dinheiro, não tive medo. Fayetteville é a cidade de uma amiga americana, que o destino nos conectou, que me chama de brother. Eu a conheci em Kumamoto, no Japão, em 1989, quando morávamos lá. Ela era missionária luterana, e por isso assisti muitas "missas" na igreja dela. Pensei: se necessário for, ligo pra Nancy, seu pai era um lider religioso respeitado na cidade.

Com minha sister Nancy em Alexandria
Quando cheguei em Rockville, entrei em contato com ela e lhe contei a história. Ela estava mais perto do que imaginava; morava em Alexandria, na Virginia. Washington, DC fica na fronteira dos Estados de Maryland e Virginia. Matei dois coelhos de um só vez. Visitei a ficante e a Nancy ao mesmo tempo. Nancy me mostrou a capital e sua cidade Alexandria.

Em 2004 fui a Raleigh, na Carolina do Norte visitar um irmão que morava lá, cuja esposa era irmã da ex-ficante. Lá encontrei a Nancy de novo; casada, morando em Raleigh. E assim os nossos destinos nos cruzam. Já contei que quando morei em Atlanta em 1986, ela também morava lá ? Fazia faculdade.

De quem era o Dinheiro ?
Mas a pergunta que não quer calar é: de quem era tanto dinheiro ? Não era meu. Uma pessoa amiga me pediu para levá-lo; pois parte era para a sua conta corrente, e para pagar despesas da filha que morava lá. Tinha valores menores de outras pessoas. Era dinheiro quente, pois tinha recibo de compra no Banco do Brasil. Mas nunca mais quis saber de levar dinheiro pra ninguém.

Para finalizar, voltei para o Brasil dia 12 de agosto de 1991. A minha cunhada, que foi me buscar no aeroporto me, disse: "Nasceu o Lucas Afonso. Mas ele tem um problema". Nesse instante a minha cabeça rodou mais que juizo de doido. Que problema seria esse ? Lucas é filho de um irmão.
Era  problema muito sério. E deu trabalho para resolvê-lo. Em geral, as crianças que nascem com esse problema, têm atraso mental, mas graças a Deus, Lucas tinha um problema físico, mas não mental. Ficou curado e hoje é um engenheiro de computação.

Teje Preso no Japão
Meus filhos, já contei pra vocês quando e porque fui preso no Japão? Lá foi diferente. Não fui algemado, mas fui posto numa cela na cadeia. Mas tiveram a gentileza de colocar uma mesa e uma cadeira, e, ao meu pedido, esperar o meu orientador chegar.  Mas isso é assunto para outro post.

Deus seja louvado.

Cláudio Nogueira

PS. A Fabiana quer saber por que o Lucas entrou no texto. Porque a vida é assim mesmo, uma coisa conectada na outra. E nunca mais esqueci dessa data.

For the Record : Preso na Carolina do Norte

Para Maria Fernanda, João Paulo, Pedro Henrique e Maria Rafaela.

Toefl Test
Há 25 anos fui preso na cidade de Fayetteville, na Carolina do Norte. Já não me lembrava mais dessa história, mas domingo (03/07), em uma conversa de irmãos com um amigo,sobre a Carolina do Sul e a do Norte, o Vicente comentou: "Ele foi preso na Carolina do Norte." É verdade, eu nem me lembrava mais disso: fui preso e algemado. Mas já paguei minha dívida com a sociedade.

Dia 6 de agosto de 1991 embarquei para Miami, para fazer a prova do TOEFL, Test of English as a Foreign Language. Para quem deseja estudar em uma universidade americana tem que fazer o Toefl, que atesta o nível de proficiência do candidato. Ele é válido somente por dois anos. Eu já havia feito anteriormente, mas já tinha perdido a validade.

Campeões do Mundo
Antes de prosseguir, não posso deixar de registrar uma coisa muito interessante que ocorreu no front desk do hotel. Disso eu jamais me esquecerei. O senhor que me atendeu, quando soube que eu era brasileiro, disse-me os nomes dos jogadores da seleção brasileira de 1958; quando fomos campeões pela primeira vez. Isso é incrível ou não é? O cara era argentino.

Eu tinha planejado que depois que terminasse o teste eu iria dirigindo para Rockville, em Maryland, que é a Goiás do States, pois dentro dela fica a capital Washington. Rockville fica a meia hora de Washington; e tem trens ligando as duas.

Iria visitar uma namorada, que era daqui de Manaus, mas que foi morar com a irmã. Na realidade não era um namoro firme, como se dizia na época, era uma ficante, como se diz hoje. Estávamos em fase de negociação. Fui lá pra ver se a gente fechava o contrato.

Sem Cartão
O negócio começou errado logo na chegada. Fui alugar um carro e descobri que não tinha levado o cartão de crédito. Ninguém aluga carro com pagamento em cash.  No cartão está toda a vida da pessoa. É muito mais seguro para quem aluga. Depois de rodar por várias locadoras e não conseguir alugar um carro, uma pessoa me indicou a Rainbow rent a car; que aceitou o pagamento em espécie.

Fiz o teste, que acabou por volta de uma da tarde; comi alguma coisa e peguei a estrada: I90 N, interstate 90 north. Seria algo em torno de 15 horas de estrada. Por volta das 23 horas o sono chegou, e chegou com muita vontade.

Essa viagem foi uma leseira baré, pois não verifiquei se de avião era mais barato; e porque havia decidido ir dirigindo sem parar. Mas parei em uma rest area, lugar onde motoristas profissionais e carros de passeio param para beber alguma coisa, ir ao banheiro e descansar.
Não aguentei. Parei e dormi um pouco. Quando acordei fui ao banheiro, tomei água e um pouco de café. Ao voltar para o carro constatei que ele estava fechado com a chave dentro. Tentei abri-lo, mas não consegui. Pedi ajuda dos presentes,mas não conseguimos. Era um Mitsubishi, do tamanho de um Gol. Nas laterais, além dos vidros das portas do motorista e do passageiro, havia um terceiro vidro, em forma de um triângulo. Igual ao que o fusca tem na frente. Só que era atrás e não abria, era fixo.

Havia um caminhão de mudança estacionado. Fui falar com o motorista, que me deu uma lata de tinta. Dei uma cacetada com a lata no vidro pequeno, que o assento detrás ficou cheio de vidro. Consegui entrar no carro e seguir viagem. Depois de andar alguns quilômetros, percebi que a gasolina estava entrando na reserva, e naquele trecho a estrada estava muito escura. Até que vi uma placa informando a próxima saída: Fayetteville Regional Airport. Eu pensei: é pra lá que eu vou. Aeroporto é sempre um lugar movimentado. Era uma hora da manhã do dia 8.

Teje Preso
O aeroporto era pequeno. Lembrou-me do nosso Ponta Pelada. O estacionamento estava cheio de carros; mas o aeroporto estava fechado. Não tinha uma viva alma. Estacionei, e comecei a gritar: anybody there? Tem alguém aí ? Imaginei que deveria ter um vigia. Como ninguém respondeu, me conformei, e pensei: vou ficar aqui até amanhecer. E decidi dar uma volta no estacionamento. Nisso, como nos filmes, apareceram do nada dois carros de polícia com as sirenes tocando. Do primeiro desceu uma loira, que apontando uma arma para mim dizia: "Mãos na cabeça". Não senti medo. Não tinha feito nada de errado.
Fayetteville Regional Airport
A loira e um policial latino mandaram me virar de costas, e começaram a me revistar. Eu repetia: não tem nada de errado. A loira repetia: "Cala a boca ! Cala a boca !". Alguém tinha ido ao carro e voltou dizendo: " O carro é roubado, ele quebrou o vidro".
Acharam o meu passaporte no meu bolso. A loira falou pelo rádio o meu nome e disse para verificarem se entrei legalmente no país. Trouxeram um cão para cheirar o carro, em busca de drogas, eu acho. O cão parecia se negar a fazer o serviço. Não parecia muito interessado. Colocavam-no dentro do meu carro, mas ele saia imediatamente. Abriram a mala do carro, e colocaram o cão para cheirar. A mesma coisa; não se mostrou muito interessado. Aí abriram a minha mala. Ouvi quando um policial gritou que tinha liguor, bebida alcoólica. Eu levava cinco garrafas de Velho Barreiro, era encomenda do dono da casa. Médico americano, especialista em malária, que andou por essas bandas, onde conheceu a sua esposa, e gostava muito de caipirinha.
Quando acharam a cachaça, eu pensei: agora estou roubado. Mas isso - e o cachorro revistando o carro - eu assistia algemado, sentado na gaiola do carro da polícia. Porque o melhor já tinha ocorrido antes. Ao me revistarem, eles acharam o passaporte e 14 mil dólares nas minhas meias. O que levou o policial latino a exclamar: "Ó my God !". E a pensar: " Esse tá ferrado."Mas não fiquei com medo. Eu pensei: esse dinheiro não é meu. Se ele tirarem uma quantia como imposto não estou nem aí. Hoje quando me lembro que os autodenominados apóstolo e a bispa Estevam e Sônia Hernandes pegaram um ano de cadeia por terem sidos descobertos com dólares não declarados à alfândega americana, eu sinto um calafrio na espinha. A barba grande ajudava a completar o quadro de que eu não era flor que se cheirasse.
E assim as horas iam passando. Um grande movimento de policiais pra lá e pra cá; mais carros haviam chegado. O dia estava amanhecendo. Até que por volta de uma seis da manhã, um sujeito entra no carro, tira as minhas algemas, e me diz: " Você entrou legalmente no país, e achamos o recibo do aluguel do carro".

Na Delegacia
O carro ficou no aeroporto, e me levaram para a delegacia de polícia. Chegando lá, outros policiais, colocaram  o dinheiro numa mesa, na minha frente e pediram que eu contasse. E muitos simpáticos perguntaram-me como havia conseguido aquilo. Conversaram bastante. Perguntaram-me, também, o que eu fazia na vida. Disse-lhes que era engenheiro e professor, num que um disse para o outro: "He is smart. He is smart." Depois acrescentou: "Você é maluco. Você não sabe o risco que você passou. Por uma nota nesse valor (mostrou-me uma nota de 20 dólares) você poderia ser morto". Eu não entendi. Eles me explicaram que poderia ter sido assaltado.
Nisso apareceu a policial loira, o latino e um que parecia ser o chefe,que me tirou as algemas. E me disseram que eu iria falar com um juíz. Dito e feito. Na presença do juiz, a loira com voz suave, narrou o que aconteceu. E disse que tinha sido um engano por parte deles, e que não foi encontrado nada de errado. O juiz ouviu tudo, e me perguntou:
- Você quer registrar alguma queixa ?
- Não. Eu gostaria de ir embora.
- You are free to go. Sentenciou o magistrado.
A loira me levou até o estacionamento do aeroporto, onde o meu carro estava, e depois me levou até um posto de gasolina. Mas tudo isso para me fazer um pedido. Ela queria saber se não dava para lhe dar uma garrafa do liguor. Disse-lhe que infelizmente não era possível,  porque era uma encomenda e não me pertenciam. Peguei a estrada e me mandei para  Rockville.

Mundo Pequeno
No período que estive retido e algemado, como não me lembrei que poderia ser preso por não ter declarado o dinheiro, não tive medo. Fayetteville é a cidade de uma amiga americana, que o destino nos conectou, que me chama de brother. Eu a conheci em Kumamoto, no Japão, em 1989, quando morávamos lá. Ela era missionária luterana, e por isso assisti muitas "missas" na igreja dela. Pensei: se necessário for, ligo pra Nancy, seu pai era um lider religioso respeitado na cidade.

Quando cheguei em Rockville, entrei em contato com ela e lhe contei a história. Ela estava mais perto do que imaginava; morava em Alexandria, na Virginia. Washington, DC fica na fronteira dos Estados de Maryland e Virginia. Matei dois coelhos de um só vez. Visitei a ficante e a Nancy ao mesmo tempo. Nancy me mostrou a capital e sua cidade Alexandria.

Com minha sister Nancy em Alexandria
Em 2004 fui a Raleigh, na Carolina do Norte visitar um irmão que morava lá, cuja esposa era irmã da ex-ficante. Lá encontrei a Nancy de novo; casada, morando em Raleigh. E assim os nossos destinos nos cruzam. Já contei que quando morei em Atlanta em 1986, ela também morava lá ? Fazia faculdade.

De quem era o Dinheiro ?
Mas a pergunta que não quer calar é: de quem era tanto dinheiro ? Não era meu. Uma pessoa amiga me pediu para levá-lo; pois parte era para a sua conta corrente, e para pagar despesas da filha que morava lá. Tinha valores menores de outras pessoas. Era dinheiro quente, pois tinha recibo de compra no Banco do Brasil. Mas nunca mais quis saber de levar dinheiro pra ninguém.

Para finalizar, voltei para o Brasil dia 12 de agosto de 1991. A minha cunhada, que foi me buscar no aeroporto me, disse: "Nasceu o Lucas Afonso. Mas ele tem um problema". Nesse instante a minha cabeça rodou mais que juizo de doido. Que problema seria esse ? Lucas é filho de um irmão.
Era  problema muito sério. E deu trabalho para resolvê-lo. Em geral, as crianças que nascem com esse problema, têm atraso mental, mas graças a Deus, Lucas tinha um problema físico, mas não mental. Ficou curado e hoje é um engenheiro de computação.

Teje Preso no Japão
Meus filhos, já contei pra vocês quando e porque fui preso no Japão? Lá foi diferente. Não fui algemado, mas fui posto numa cela na cadeia. Mas tiveram a gentileza de colocar uma mesa e uma cadeira, e, ao meu pedido, esperar o meu orientador chegar.  Mas isso é assunto para outro post.

Deus seja louvado.

Cláudio Nogueira

PS. A Fabiana quer saber por que o Lucas entrou no texto. Porque a vida é assim mesmo, uma coisa conectada na outra. E nunca mais esqueci dessa data.