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quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

A Renúncia de João Paulo II


Erro de digitação

Possivelmente o(a) prezado(a) e-leitor(a) deve estar pensando: Ele se enganou e digitou João Paulo II ao invés de Bento XVI. Porque, hoje 28 de fevereiro de 2013 - dia dos 77 anos da minha querida tia Damiana Queiroz, a Dadazinha, que eu amo muito - quem renunciou às 20 horas em Roma, foi o cardeal Ratzinger. Contudo, meus amigos e minhas amigas, vos afirmo que o texto é sobre a renúncia de João Paulo II. Espere somente um pouco que  logo chego lá.

Dois Papas
Considerando que o assunto é renúncia papal, vamos registrar o que o Vaticano divulgou essa semana: Bento XVI terá o título de Papa Emérito. Bento XVI não deixará de existir; e o Cardeal Joseph Ratzinger não voltará a tomar posse daquele corpo. Ele continuará a ser chamado de sua santidade. 
Isso é uma novidade muito grande. Teremos dois papas, e desta vez não vai ser um em Avignon, na França e outro em Roma, como da última vez. Os dois morarão no Vaticano. Bento XVI não será ex-Papa, ele será um Papa aposentado.
Quando um bispo completa 75 anos, ele tem que se aposentar compulsoriamente; isto é, ele deixa de ser o administrador de sua prelazia, diocese ou arquidiocese, e é substituído por outro; mas, todavia, contudo, não obstante, não deixa de ser bispo. Torna-se o bispo emérito da sua diocese. Assim, teremos um papa e um papa emérito pela primeira vez na história da Igreja, considerando que há seiscentos anos atrás, quando o último papa renunciou, os bispos, exatamente como os papas, morriam no cargo. Bento XVI será não somente o primeiro papa emérito, como o primeiro bispo emérito de Roma. Isto eu já havia afirmado no post abaixo, muito antes do Vaticano se pronunciar a respeito.  Na realidade, o bispo de Roma, é o primus inter pares, o primeiro entre iguais, e por ser o bispo de Roma, sucessor de São Pedro é que se torna papa 

Dom Paulo Evaristo Arns pede a renúncia 

No texto do post abaixo "O Pastor Alemão ou Non Habemus Papa".http://www.nogueiraclaudio.blogspot.ca/2013/02/o-pastor-alemao-parte-ii-ou-non-habemus.html
sobre a renúncia de Bento XVI (que os seus desafetos na impressa gostam de chamá-lo de Rottweiller de Deus), creio ue de certo modo ficou subentendido que a renúncia por questões de idade e/ou saúde poderá ser uma rotina entre os futuros papas, como é com os bispos. Bento XVI deu o exemplo. Talvez não seja bem assim. Talvez ele tenha recebido esse exemplo de João Paulo II. Como ?



Escrevi no post abaixo:  “Os bispos têm de renunciar aos 75 anos de idade, por razões físicas, mentais, etc. Os cardeais com 80 anos não votam nem podem ser votados no Conclave (= com chaves = trancados). E por que o Papa não deve renunciar? Esse argumento já foi usado por D. Paulo Cardeal Arns quando João Paulo II estava na reta final. Ele sabia que quando um Papa está debilitado, a Igreja é administrada pela Cúria Romana. Na época achei um absurdo, uma falta de respeito, desumano, até mesmo falta de fé? Quem não acharia até segunda-feira desta semana ? Todo mundo achava.”

Vamos dar oportunidade para o próprio Dom Paulo Evaristo Arns se explicar. Em 2004, ele fez a seguinte declaração: "Sim, chegou a hora do papa renunciar para que a Igreja possa continuar respondendo às mudanças históricas e para este momento crítico que estamos passando”.  João Paulo II faleceu em abril do ano seguinte.
Muito antes disso, declarou: “Eu falei com ele [João Paulo II] sobre isso com toda a simplicidade. Indiretamente, perguntei-lhe se não era demais para ele [as obrigações que tinha]. Esta foi a sua resposta: ‘Paulo, daqui até aqui (apontando do peito até a cabeça) eu me sinto bem. Eu sou a mesma pessoa que era quando fui eleito para o papado. Eu não vejo qualquer razão para renunciar porque minha cabeça, meu coração e meus órgãos estão todos bem’"
Esse encontro ocorreu quando o Cardeal Arns ainda ia a Roma regularmente, como arcebispo de São Paulo. Dom Paulo Arns se aposentou das suas funções em 9 de abril de 1998, aos 76 anos. "O papa tinha alguma dificuldade para andar, mas nós andamos para cima e para baixo no corredor. Nós falamos em alemão. Ele fala alemão claramente, e eu também, pois era a minha segunda língua em casa.”
Mesmo sugerindo a renúncia D. Paulo Arns dizia na época, que o Papa estava ciente de suas responsabilidades:  "Esta consciência tem a ver com o espírito de fé, de inteligência e das coisas que estão acontecendo ao nosso redor...Se ele acha que nem tudo está em ordem, então é provável que ele continue a aguardar até que o nome de um novo papa comece a germinar nos corações dos cardeais". Será que Bento XVI acredita que  esse nome já germinou ?

A Possibilidade de Renúncia

Em 1998, João Paulo já tinha 78 anos, e desde de 1991 tinha Mal de Parkinson e a renúncia já tinha passado pela sua cabeça. Com esse idéia em mente convocou  alguns auxiliares, entre eles o Cardeal Ratzinger. Quem nos narra esse episódio é o Cardeal Stanislaw Dziwisz, arcebispo de Cracóvia, Polônia, que por quarenta anos foi o secretário particular de Karol Wojtyla: “Sobre a questão da renúncia. Eu gostaria de destacar que João Paulo II realmente lidou com essa questão mesmo antes do ano de 2000 [Ano do Jubileu]. Paulo VI tinha decidido excluir os cardeais acima de oitenta da eleição papal. Similarmente, João Paulo II se perguntava se o Papa não estaria obrigado a deixar o cargo quando chegasse aos oitenta, ou, como ele pois no seu testamento, se o seu aniversário de oitenta anos não significaria que a hora tinha chegado [ele fez oitenta anos em 2000] ‘para dizer como Simeão da Bíblia, Nunc dimittis.’” “Agora, Senhor, despedes em paz o teu servo, segundo a tua palavra (Lucas 2: 29).
“O Santo Padre, portanto, decidiu consultar os seus colaboradores mais próximos, entre eles  o Cardeal Ratzinger, prefeito para a Congregação para a Doutrina da Fé. E, depois de refletir e examinar os documentos deixados por Paulo VI sobre o assunto, ele chegou a conclusão que ele deveria se submeter a vontade de Deus – isto é, que ele deveria permanecer no cargo pelo período que Deus desejasse mantê-lo lá. ‘Foi Deus que me chamou. Ele vai me chamar de volta, também, de acordo com a sua vontade.’
“Ao mesmo tempo, João Paulo II  trabalhou em um procedimento de renuncia caso ele não mais fosse capaz de exercer sua missão papal. Você vê, que ele realmente teve sérios pensamentos sobre a possibilidade de renunciar. E ainda assim, ele decidiu  fazer a  vontade de Deus até o fim. Ele aceitou sua cruz. Ele queria seguir o exemplo de Cristo e carregar seu fardo até o fim de sua vida.”
Talvez por isso a impressa tenha dado destaque as palavras do Cardeal Dziwisz, sobre a renúncia do Papa Bento XVI, causando um certa controvérsia: “Você não desce da cruz.” Essa expressão parece ter sido editada, ou dita dentro de um contexto, porque em uma entrevista para EWTN – Global Catholic Network News, ele disse:  Nós devemos aceitar a vontade de Deus. A decisão foi cheia de oração, reflexão e o Santo Padre certamente não pode ter feito isso facilmente.[Eu] Estando  por muitos anos perto de João Paulo II, eu sei que essas decisões custam muito. E esta decisão foi difícil, mas corajosa.”

 Idade é problema ?

João Paulo II foi papa até completar 85 anos, 1 mês e 16 dias. Bento XVI até hoje, com  85 anos, 10 anos e 12 dias. Então de agora em diante os papas vão renunciar quando completarem 85 anos? Não exatamente. Já foi dito repetidas vezes que os bispos se aposentam  compulsoriamente aos 75 anos de idade. Na realidade, ao completar essa idade, o bispo tem que apresentar a renúncia da administração da Igreja local que é o pastor, mas cabe o papa aceitá-la ou não. Dom Paulo Arns foi arcebispo de São Paulo até os 76 anos e meio. O sucessor do Cardeal Karol Wojtyla na arquidiocese de Cracóvia ficou no cargo até os 78 anos de idade. Só saiu após a morte do Papa João Paulo II, para ser substituído pelo Cardeal Dziwisz. Mas o campeão de permanência no cargo pós-75 anos foi o Cardeal Kazimierz Świątek, que foi arcebispo de Minski-Mohilev, na Bielorússia até a sua morte aos 96 anos, em 2011. É a inversão da regra, bispo morrendo sem se aposentar, papa se aposentando sem morrer.
Contudo, o primeiro passo foi dado, ou o primeiro exemplo. Agora já temos Papa emérito, só falta agora os filólogos criarem o coletivo de papas.

Cláudio Nogueira

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