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segunda-feira, 25 de março de 2013

Capitalismo Amazônico


Tenho grande admiração pelos escritos do Antônio José Lopes Botelho. E desta vez ele inova, lança como e-book, disponível no iTunes para download, a segunda edição, revista e atualizada de seu Pequeno Ensaio em Prol da Construção de um Capitalismo Amazônico a partir de Manaus. (link no final do texto).
Leio tudo que  ele escreve; discordo de alguns posicionamentos – o que é plenamente natural - mas a minha admiração vem de sua profunda e espontânea necessidade de colaborar com o pensamento caboclo – talvez ele prefira endógeno - sobre economia política e industrialização da Amazônia Ocidental.
        Colaborador da Suframa há mais três décadas, onde foi diretor de planejamento e de acompanhamento de projetos industriais; graduado em engenharia civil e administração de empresas, professor universitário, especialista em ciências políticas, mestre em engenharia de produção; não se limita a limpar sua mesa no final do expediente e esvaziar sua mente com os assuntos pertinentes à instituição que serve; mas vai para casa, para sala de aula, pensando, estudando como sugerir melhoras ao Modelo (ele prefere o conceito projeto) Zona Franca de Manaus. E isso faz continuamente. Sonha e tem pesadelos com este Projeto - do qual possui enorme conhecimento –  sofre, discorda e questiona; mas não nega a existência de méritos. É o mais profícuo autor que conheço sobre o assunto, com mais de cinco obras publicadas; a maioria em papel, e algumas em mídia digital.
As ideias de Antônio José Botelho estão  anos-luz de ser uma unanimidade – tal coisa não existe em economia normativa - mas se todos nós: professores universitários, políticos, empresários e autoridades governamentais nos preocupássemos com o Projeto Zona Franca de Manaus, com o seu Polo Industrial, apresentando críticas e sugestões  como ele o faz, como certeza, após 45 anos de existência, a ZFM seria bem melhor. Aí reside a minha admiração por seu trabalho; um tanto quanto ousado  na medida em que tem a consciência de questionar atitudes e ações da instituição poderosa que trabalha. Isso parece não intimidá-lo, ao contrário, parecer ser um desafio. Acredito que corre riscos para estar em paz com a sua consciência, e uma vontade hercúlea de colaborar e de ser útil. E até me atreveria em dizer: ser um militante ativo na causa que abraçou: a busca de (do seu) um capitalismo amazônico.
Esse Pequeno Ensaio em prol da Construção de um Capitalismo Amazônico centrado em  Manaus, como os outros textos que Botelho escreveu, presta um grande serviço a todos interessados ou preocupados com desenvolvimento  com esta parte do Brasil. Se fossemos obrigados a resumir toda a sua obra  em poucas palavras, com certeza seus leitores escreveriam assim: É um eterno preocupado em arraigar o Projeto ZFM  - constituído primordialmente de empresas multinacionais, o motivo de suas preocupações - em criar condições para o aparecimento de uma economia endógena sustentável. No que no texto denomina de desenvolvimento industrial e tecnológico minimamente autônomo e interdependente: a sua amazonidade.
O texto presta serviço não somente pela apresentação de críticas e sugestões ao Projeto ZFM, mas por abordar tópicos ainda pouco escritos ou traduzidos para a língua portuguesa como: Sistema Nacional de Inovação (SNI), Hélice Tríplice e Sistema Regional/Local de Inovação (SRI). Os poucos textos que existem no vernáculo, como são  assuntos relativamente novos, mesclam conceitos não mescláveis, ou  tratam desiguais como se similares fossem: SRI e arranjos produtivos, para citar um exemplo. Creio, profundamente, que estudiosos e estudantes poderão se beneficiar do mesmo, bem como os atores envolvidos com a problemática abordada.
Ludvall[1] escreveu em 1994: “No limiar de um novo século, estamos operando com modelos e políticas que se aplicam ao  último.” O texto busca e deseja  acabar com esse paradigma. Botelho tenta introduzir, de forma detalhada o “seu” caminho teórico e empírico para o que ele chama de ‘hélice tríplice neosschumpeteriana-manauara’. Para tanto se utiliza das teorias de Joseph  Schumpeter e Georg Friedrich List. O primeiro é muito conhecido dos leitores. Botelho relembra conceitos e preocupações do famoso economista austríaco. Entre eles, com certeza, ele espera que eu mencione a inovação. Todavia, chamo a atenção - para a consecução dos objetivos tencionados pelo autor - sobre o crédito, como umas das pedras angulares do “seu”capitalismo ou de qualquer capitalismo. Possivelmente, a falta deste seja o grande gargalho. Posto que não temos uma cultura de joint venture, nem o adequado suporte financeiro para startups, e nem incubadoras experientes, para a grandeza que o modelo exige.
 A teoria de Schumpeter sobre o desenvolvimento econômico é muito bem explorada por Botelho. Somando-se a este, a apresentação de List pode ser realmente o backbone das ideias defendidas. Botelho apresenta,como mesmo menciona, um economista pouco “festejado” ou aprendido. Cuja teoria, aparentemente, se enquadra dentro de seus interesses.
O texto tem o seu viés dentro do que se denomina de economia evolucionária. Esta estuda o desenvolvimento econômico a partir da perspectiva de mudanças permanentes na intensidade, estrutura e qualidade do processo econômico.Essa perspectiva é também típica da abordagem de sistemas de inovação. As mudanças tecnológicas em ambas abordagens  são tratadas como um processo endógeno, significando que inovações são consideradas como vindo de dentro do sistema, ao invés de serem introduzidas exogeneamente.
Ludvall acrescenta (o sublinhado e itálico é nosso): Não há dúvida de que, no século seguinte, a capacidade de produzir e usar o conhecimento será a chave para o sucesso dos países, bem como para empresas e indivíduos. A boa alocação de recursos tangíveis será apenas de importância secundária; o que importará é o quanto  se terá  sucesso em  desenvolver organizações que promovam a aprendizagem e o uso inteligente do conhecimento. Países que são bem sucedidos em melhorar as qualificações e na criação de empregos intensivos em conhecimento - ou seja, os países com fortes sistemas de inovação - serão mais bem sucedido em evitar o desemprego e  o desenvolvimento de trabalhos inúteis.
Ludvall tem em mente os países centrais, mas se aplica a nós também. Botelho afirma que nós  “precisamos de um novo paradigma que supere a lógica simples da prorrogação do Projeto ZFM, ou até mesmo sua perenização, por uma lógica complexa que sinalize para a formulação de políticas públicas que não só consolidem o processo de industrialização em curso, mas, sobretudo, crie uma trajetória tecnológica alternativa forjadora de um novo marco civilizatório sob a égide da sustentabilidade, o que significa dizer, investimentos conscientes, consumo inteligente e tecnologia limpa.
Com raríssimas exceções, o aparecimento dessas instituições/organizações ocorrem de forma espontânea- bottom up. Portanto, cabe, principalmente nos países em desenvolvimento, ao Estado  propiciar as condições necessárias para o aparecimento ou até mesmo a criação dessas instituições; é o chamado top down.  E isso ocorre por meio de formulação de políticas públicas direcionadas. A Zona Franca de Manaus nasceu da necessidade da ocupação da Amazônia. Essa fase já está superada, agora é hora de uma política industrial de Estado direcionada a perenização do Polo Industrial de Manaus (PIM). Para que no futuro possa existir mesmo sem os incentivos fiscais. A  Zona Franca de Manaus pode acabar, o PIM não.
No terceiro milênio, na Era do Conhecimento, vantagens comparativas, isenções fiscais entre elas, cederam lugar a vantagens competitivas: concentrações industriais baseadas na tecnologia e no conhecimento, alta produtividade, produzindo bens de maior valor agregado = inovação. Constituído da interação de três principais atores: governo (instituições governamentais nos três níveis), academia (universidade, institutos de pesquisa) e indústrias. E a materialização/comercialização do conhecimento.
Dependendo de como essa interação ocorre e os objetivos que se deseja alcançar, temos os chamados Sistemas Nacionais ou Regionais ou Locais de Inovação, ou a Hélice Tríplice, para mencionarmos apenas três conceitos.  Conceitos abordados por Botelho. Desta forma sugiro ao leitor não afeito a tais conceitos e outros mencionados, que leia o glossário antes de começar a leitura do texto principal.
Botelho é um visionário. Há algum tempo vem escrevendo ou palestrando sobre a Hélice Tríplice. Embora, particularmente, acredite que este seja um longo caminho a ser percorrido. Contudo, vislumbro um futuro promissor com a construção do novo campus da Universidade do Estado do Amazonas, onde governador e reitor dizem que está se tornará uma importante instituição. Não existe hélice sem uma academia produzindo conhecimento e transferindo-o para indústria.
Em 26 de fevereiro de 2013, a Suframa lançou o “Pacto pela Educação e pelo Desenvolvimento da Liderança Sustentável no Amazonas.” E a instituição publicou: “O modelo de governança do pacto está estruturado no formato ‘hélice tríplice’, em que há parceria indissociável entre governo, academia e indústria."
Botelho afirma que modelo catching up  gera uma capacitação tecnológica tardia fruto de uma concentração industrial baseada em multinationais corporations (MNC). O modelo ou projeto adotado, ou a politica industrial adotada, não gerou avanços tecnológicos, dai a sua preocupação da criação de Capitalismo Amazônico e de um Sistema Manaura de Inovação.  Eu  acrescentaria : nem o aparecimento de laboratorios de P&D. Contudo, afirmo que essa foi mais uma falha no modelo (substituição de importações- ocupação da Amazônia) ou mesmo a falta de um modelo. O não enraigamento de firmas estrangeira na economia local é praxis corrente aqui e alhures. É vero. Contudo, não é uma caracteristica incorrigível dos cluster ou aglomerados MNC. Há existências de casos que as MNC trouxeram todo o seu conhecimento – porque o modelo as levou a isso - e ocorreu transferência de tecnologia; como em Cingapura e Bangladesh, na Índia, para mencionar apenas dois exemplos, provocando o aparecimento de firmas locais competitivas, em um momento posterior.
As perguntas mais importantes aqui são:  O texto traz alguma contribuição a nossa sociedade? O leitor tirará algum proveito do seu conteúdo? Acredito profundamente que a resposta seja sim. Por vários motivos. Da necessidade urgente de reavaliarmos o Projeto Zona Franca de Manaus, frente a uma necessidade de ser competitivo e os desafios que se apresenta. Quando foi criado em 1967, a realidade do Brasil era completamente diferente. Os obstáculos sofridos pela ZFM  começam dentro de seu próprio território: uma infraestrutura comprometida em vários aspectos. Ameaça interna: com as constantes guerras fiscais entre os estados, inexistência de tecnologia de ponta em algumas áreas; ameaças externas: hoje existe uma nova China, que se parece com a antiga tão somente na supressão dos direitos humanos, para ficar em apenas um exemplo.
 Todo texto sério sobre a ZFM que possa trazer luzes, soluções ou simplesmente provocar o debate deve ser bem vindo. E o livro do Botelho tem essa característica.

Tenham todos uma abençoada Semana Santa e uma Feliz Páscoa.

Cláudio Nogueira


[1] Lundvall, B. (1994). The global unemployment problem and national system of innovation, in D. O’Doherty (ed.) Globalization, Networking and Small Firm Innovation.London: Graham & Trotman.

PS1. O livro está disponível para download em seu iPad como iBooks ou em seu computador com iTunes. https://itunes.apple.com/br/book/pequeno-ensaio-em-prol-da/id586453707?mt=11
PS2. Maiores informações sobre o autor e seus livros: http://antoniojosebotelho.argo.com.br/

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